Muitos brasileiros gostam de chamar seus carros ou suas motos de "nave" ou "avião". Em muitos casos, os substantivos que viram adjetivos nem seriam muito aplicáveis. Mas paixão é paixão. Pois em outros casos são muito justos - como na geração atual da Harley-Davidson Street Glide. Sim, senhoras e senhores: essa moto é um avião!
A moto foi inteiramente renovada lá nos Estados Unidos na linha 2024 e o modelo que aqui avaliamos é o mais atual - e continuará assim na linha 2025. É bem diferente das gerações anteriores e, com certeza, a melhor delas. Pelo menos em tecnologia e desempenho, já que o design provocou alguma controvérsia quando surgiu - ao lado da ainda mais polêmica Road Glide, cuja geração atual foi apresentada simultaneamente.

No caso da Street Glide, acho que é mesmo questão de gosto. A beleza está no olhos de quem vê e eu e várias pessoas que viram essa moto durante nossa avaliação achamos seu design muito bem-resolvido, ainda que pequenos detalhes possam causar certa - e passageira - estranheza.
Na frente, a moto exibe um farol com linhas mais retas do que antes embutido na carenagem "batwing" redesenhada. Nesta, surgem dois filetes discretamente curvos, que fazem a função de luzes de rodagem diurnas e também de piscas dianteiros. Tudo com LEDs. Um aspecto geral elegante, limpo e bonito.
De perfil, a Street Glide atual está mais harmoniosa que as antecessoras. Não parece mais "grande demais" do meio para a frente e "magrela demais" do meio para trás. Assim como eu, há quem sinta falta de um sissy-bar (encosto para garupa) lá atrás, até para equilibrar os volumes. Mas isso também é questão de gosto: conheço muitos fãs da Street Glide que dispensam o sissy-bar.
Lá atrás, por sua vez, as lanternas estão inseridas na curva do para-lamas, que é bem comprido. As seções vermelhas têm formato de colchetes e, em sua parte interna, há lentes brancas, que são os piscas - que piscam na cor amarela! Mais uma vez, tudo com LEDs, claro. À noite, esse conjunto não passa - ele desfila!
À frente do piloto surge um lindíssimo painel de TFT com telona de 12 polegadas. Com sistema operacional Skyline, tem três modos de exibição, é riquíssimo em informações e sua visibilidade é ótima. Não exige um curso de TI para que o proprietário consiga manuseá-lo e usar todas as suas funções, mas requer um tempo para que o piloto se habitue aos muitos comandos.
O painel é "touchscreen" e tem muitas funções, inclusive navegação GPS nativa e seleção de um dos quatro modos de pilotagem - esportivo, estrada, chuva e personalizado. Cada um destes modos de pilotagem tem parâmetros específicos de entrega de potência, freio-motor e interferências do ABS e do controle de tração.
Logo acima do painel, há uma aleta de ventilação que pode ser aberta ou fechada manualmente. E logo abaixo há uma prática "gavetinha", que é aberta com um toque em um botão lateral. Dá para guardar o documento da moto ou pequenos objetos.
Mais abaixo, vemos o enorme motor V2 Milwaukee-Eight de 117 polegadas cúbicas - equivalente a 1.923 cm³ de cilindrada. Injetado e com novos cabeçotes com refrigeração líquida, entrega 107 cv de potência a 5.020 rpm e torque de forçudos 17,7 kgf.m a 3.500 rpm.
Outras especificações importantes da moto são as suspensões dianteiras Showa invertidas, os freios com disco duplo na frente e simples atrás, o câmbio de seis marchas com secundária por corrente e os pneus Dunlop série Harley-Davidson calçando lindas rodas de alumínio brilhantes. Feitas as apresentações, vamos ao que interessa: como é pilotar essa nave!
Fui buscar a moto na concessionária Rio Harley e meu primeiro contato já foi bem amistoso. Embora seja grande e pesada, a Street Glide é baixa. E como o problema em motos é altura, e não o peso, me instalei bem com meus 1,70 m de altura.
O banco a apenas 71,5 cm do solo deixou meus pés com pleno alcance do chão e o peso nem parece ser de 368 quilos em ordem de marcha. Saí com a moto da loja e já nos primeiros metros senti relativa facilidade na condução.
Também me impressionei rapidamente com as respostas ao acelerador. Aí vi que a moto estava no modo de condução "esportivo", que é muito forte. Passei para o modo "estrada" e tudo ficou mais civilizado e seguro.
Nos primeiros 35 quilômetros de test-ride, da revenda até minha garagem, fui me acostumando com a moto. Passei por trechos de trânsito pesado e, para minha surpresa, a Street Glide não sofreu demais. Claro que não é uma moto urbana de baixa cilindrada e não tem agilidade para serpentear por entre os carros em certas situações, mas raras vezes fiquei preso no tráfego.
O motor, como acontece em quase todas as Harley-Davidson, esquenta um bocado. Mas a refrigeração líquida dos cabeçotes ameniza bastante esse drama. Nos trechos livres, inclusive naqueles em que rodei nos dias seguintes, é claro que a Street Glide ficou muito mais à vontade.
Pode ser usada no dia a dia? Até pode. Mas o lugar dessa HD, claro, é na estrada. Lá é possível explorar a maior virtude dessa moto - o desempenho avassalador. Vire o acelerador e se segure, porque as acelerações são fortíssimas.
Mesmo no modo "estrada", cada resposta é uma injeção de adrenalina, que se intensifica na ótima capacidade de curvar e até nas frenagens fortíssimas, mas sem sustos, que transmitem muita sensação de segurança. Quer levar susto? Bote no modo "esportivo"...
O motor ruge a cada acelerada, mas o ronco é baixo e grave: nada de incomodar quem está à volta. A Street Glide também exibe agilidade surpreendente, com uma ciclística muito superior às das antecessoras. Não tem o pneu dianteiro largo demais, que quicava e "espalhava" a frente nas curvas, nem o perfil baixo da que veio depois e sofria demais em qualquer irregularidade do piso.
A Street Glide atual também é nada menos que 8,2 quilos mais leve que a anterior, modelo 2023. Isso melhora todos os aspectos do desempenho, das respostas às acelerações ao comportamento nas curvas, passando pelas frenagens. Em resumo, a Street Glide finalmente virou uma moto muitíssimo equilibrada, além de emocionante e divertida de pilotar. Um comportamento dinâmico impressionante.
Mas nada é perfeito, não é? A Street Glide atual comete um pecado, que se não é capital - já que é totalmente resolvível -, não deveria nem passar perto. Algo que se espera de qualquer Harley-Davidson da família touring é conforto, certo? Mas aqui, nessa moto, isso é algo bem limitado.
Explicamos: as suspensões têm calibragem bem rígida. Isso ajuda a manter a moto colada ao chão nas curvas, já que não há reboladas, mas gera rebotes incômodos nas irregularidades e transmite parte dos trancos para o corpo do piloto. Pelo menos a pré-carga do bichoque traseiro é ajustável - fiz isso e amenizei um pouco esse problema.
Além disso, o banco da Street Glide não ajuda. Embora seja lindo, macio ao toque das mãos e até muitíssimo anatômico, quando você senta ali em cima e parte para a pilotagem, percebe que é mais duro que o desejável. Resultado: a coluna sofre. Um garupa, então, sofre mais: seu espaço é pequeno e levemente inclinado para trás.
Como se resolve isso? À velha "maneira Harley-Davidson": troque o banco. No embalo, aproveite e instale um sissy-bar. Com um banco mais macio e um encosto lá atrás, a Street Glide fica muito melhor tanto para piloto quanto para garupa.
Outro ponto negativo da moto são os espelhos. Semelhantes a "orelhinhas" e instalados na parte interna do "batwing", são pequenos e proporcionam retrovisão um tanto limitada. Além disso, têm pequena margem de ajustes e, ao ajustá-los, sempre parece que vão quebrar.
Fora isso, vale ressaltar que a posição de pilotagem da Street Glide é bem satisfatória: guidão em altura adequada, plataformas dianteiras confortáveis - eu gostaria que fossem mais avançadas, mas ok -, e sensação de pleno domínio da moto e de todos os comandos. Ou seja, uma ergonomia bem-resolvida, também.
O resumo do nosso test-ride é que essa Street Glide é a melhor de todos os tempos. Vale o - altíssimo - investimento de R$ 175.500? Sim, mas obviamente para quem tem o bolso bem forrado e quer uma Harley-Davidson touring com o clássico "batwing" dianteiro que a Road King Special não tem, sem o exotismo excessivo da carenagem dianteira da Road Glide e ainda sem o peso extra do tourpack traseiro da Ultra Limited.
Enfim, é um meio-termo bem posicionado, que tem - e certamente continuará tendo - muitos fãs.
Preço: a partir de R$ 175.500
Motor: Milwaukee-Eight™ 117, dois cilindros em V, 1.923 cm³, injeção, refrigeração líquida, potência de 107 cv a 5.020 rpm e torque de 17,7 kgf.m a 3.500 rpm
Transmissão: câmbio de seis marchas com secundária por correia. Controles de Tração (TCS)
Suspensões: dianteira com telescópios invertidos Showa de 49 mm de diâmetro e traseira bichoque com ajuste de pré-carga
Freios: dois disco flutuantes na frente e disco simples atrás, com ABS otimizado para curvas (C-ABS)
Pneus: Dunlop série Harley-Davidson, medidas 130/60 R19 na frente e 180/55 R18 atrás. Rodas de alumínio
Tanque: 22,7 litros
Consumo: 16,6 km/l (dado de fábrica)
Dimensões: 2,41 m de comprimento, 1,62 m de entre-eixos, banco a 71,5 cm do solo, vão livre de 14 cm e peso de 351 quilos a seco e 368 quilos em ordem de marcha, 32 graus de ângulo de inclinação máximo para os dois lados
Capacidade dos baús: 69 litros
Som: dois alto-falantes com 5,25 polegadas cada e 100 Watts de potência total
Conectividade: smartphone por Bluetooth, intercomunicação entre piloto e garupa (opcional), entrada USB, Apple CarPlay (com ou sem fio)
Cores disponíveis: preta, prata, cinza, azul e vermelha (a mais bonita, claro)



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