Nova F1 ficou só para 2022. E isso é bom

Entenda porque o adiamento na mudança das regras, previstas inicialmente para 2021, deve melhorar o espetáculo

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Livio Oricchio
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Representantes das dez equipes de F1, os dois diretores da Fórmula One Managent (FOM), Chase Carey e Ross Brawn, e o presidente da FIA, Jean Todt, decidiram, por unamimidade, nesta quinta-feira, adiar a estreia do que seria a nova F1 de 2021 para 2022.

O motivo é a crise mundial provocada pelo coronavírus. O campeonato deste ano previa, originalmente, 22 etapas, o maior da história de 71 anos da F1. Mas algumas corridas - já se sabe - não poderão ser realizadas, como a da Austrália e a de Mônaco.

O Automóvel Clube de Mônaco confirmou, ontem, o cancelamento do evento que deveria ser realizado dia 24 de maio. E os organizadores da prova de Melbourne já manifestaram não haver como levar a F1 de volta à Oceania. Todos estavam lá para a abertura da temporada, dia 12, mas o GP foi cancelado, também por causa da COVID-19. Outro GP também que não deverá ser disputado é o do Barein.

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Assim, em vez das 22 etapas originais, provavelmente o campeonato terá 19. Bem, isso se a projeção de conter a pandemia do coronavírus estiver certa e o mundial de F1 começar mesmo dia 7 de junho, no Azerbaijão, atual previsão.

As lideranças das dez equipes trocaram mensagens nos últimos dias a fim de definir a proposta de transferir para 2022 quase tudo o que estava previsto para o ano que vem. A Ferrari era a única que relutava, mas, ontem, seu diretor Mattia Binotto entendeu que seria de fato bom para a F1.

Vamos entender melhor o que se passa?

Carey, Brawn, Todt, os engenheiros contratados pela FIA, os experientes Nikolas Tombazis e Pat Symonds, e os diretores das dez equipes discutem há três anos um novo modelo para tudo na F1, com estreia prevista, até ontem, para 2021.

História antiga

Vamos um pouco mais fundo na questão. As relações entre as três vertentes máximas da F1, ou seja, FOM, FIA e os times, são ainda regidas por um extenso, complexo e secreto contrato onde quase tudo está previsto - como o critério de distribuição do dinheiro arrecadado pela FOM e o de definir os regulamentos.

Você se lembra de nossas últimas conversas que estamos falando de muito dinheiro, já que a FOM fatura por ano US$ 1,2 bilhão, ou R$ 6 bilhões.

O contrato tem nome, Acordo da Concórdia, por ter sido assinado, originariamente, na Place de la Concorde, sede da FIA, em Paris. Sabe a quando remonta a primeira versão do Acordo da Concórdia? Ao distante 1981.

A última versão foi assinada entre as três partes em 2013. Valeria por sete anos. Pois bem, este é o último.

Obter lucro

O grupo americano Liberty Media concluiu a compra dos direitos comerciais da F1 em janeiro de 2017. E a filosofia americana pouco tem a ver com a dos europeus. Eles se tornaram donos dos direitos de explorar a F1 não por idealismo, mas como negócio. Investiram nada menos do que US$ 8 bilhões por acreditarem que, com o tempo, terão lucro.

Para o projeto do Liberty Media dar certo, tanto o seu proprietário, John Malone, quanto o diretor que ele designou para a F1, Chase Carey - a fim de substituir o supereuropeu Bernie Ecclestone -, sabiam que muita coisa teria de ser revista (apesar do desafio que é convencer os europeus a mudar alguma coisa, seja lá o que for).

Malone e Carey queriam - e conseguiram, em parte -, com a ajuda decisiva de Brawn, inserir um extenso pacote de mudanças na F1 para passar a valer depois do fim do Acordo da Concórdia, a partir de 2021.

Além do esperado

Apesar de não ter a abrangência desejada, o Liberty Media foi capaz de uma proeza, tal a magnitude das mudanças que vêm aí, tudo estabelecido pelo novo contrato entre FOM, FIA e as equipes. Não tem nome, ainda, mas não mais será Acordo da Concórdia.

Exemplos de avanços: a partir de 2021 seria necessário bem menos dinheiro para disputar o mundial com chance de vencer corridas e lutar pelo título. “É surreal o que alguns times investem”, disse Carey quando assumiu, há três anos.

Foto de um carro de fórmula um no GP do Japão tirada da abertura de um guard rail
Mudanças, agora previstas para 2022, tendem a deixar a Fórmula 1 mais equilibrada
Crédito: Divulgação
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O orçamento de cada uma das três mais eficientes, Mercedes, Ferrari e Red Bull, é de algo como US$ 330 milhões, ou R$ 1,6 bilhão, por ano. As de menor orçamento são Williams e Haas, com US$ 100 milhões, ou R$ 500 milhões.

A partir de 2021 haverá um limite orçamentário para todos, de US$ 175 milhões. Já falamos disso e voltaremos ao tema.

Outra conquista: os carros serão bem diferentes. O chamado carro-asa estará de volta, com o objetivo de os pilotos poderem competir uns próximos dos outros, mesmo nas curvas, para oferecer um melhor espetáculo, com mais ultrapassagens, outra bandeira do Liberty Media. Há chance de dar certo.

A lista de mudanças na F1 é longa. Vamos nos limitar a esses pontos mencionados, ao menos hoje.

Reduzir as despesas

Essa mudança na rota do texto teve como intuito mostrar o que os dez chefes de equipe desejam ao propor a FOM e a FIA transferir a nova F1 de 2021 para 2022. Seus departamentos técnicos não precisarão mais manter duas frentes de trabalho, grandes e caras.

Uma destinada a desenvolver o modelo de 2020, ao longo do campeonato, e outra dedicada a estudar os muitos e complexos desafios de engenharia necessários para o projeto de 2021, quando, como mencionado, todos tiveram de iniciar seus estudos a partir de uma tela de computador em branco.

Ao propor o adiamento da estreia do pacote de 2021 - e encontrar respaldo na FOM e na FIA -, os chefes de equipe vão reduzir o impacto da menor arrecadação da FOM, este ano, por conta de termos menos corridas e provavelmente a perda de alguns patrocinadores. A FOM repassa mais de 60% do que recebe para os times.

Carros serão os mesmos

Agora, o que impressiona é o fato de esses mesmos profissionais da F1 terem deliberado, nesta quinta-feira, que os carros de 2021, além de não serem os da nova F1, vão ser os deste ano.

Sim, não haverá nada de significativamente diferente entre os modelos que vão terminar a temporada de 2020, possivelmente dia 13 de dezembro, em Abu Dhabi, e os que vão começar o mundial de 2021.

Pelo que ficou acertado, os projetistas poderão rever parte do conjunto aerodinâmico, mas os elementos mecânicos deverão ser mantidos. Claro que muitas outras reuniões serão necessárias para a definição do que poderá ser mantido ou revisto. E já dá para adiantar que teremos discussões acaloradas.

As duas decisões, adiar a estreia da nova F1 em um ano e a obrigatoriedade de não mudar radicalmente os projetos deste ano, em 2021, representam importante economia para as equipes. Vale lembrar que os modelos de 2020 foram desenhados a partir do mesmo regulamento técnico de 2019, também para não exigir ainda mais investimentos desproporcionais dos times.

Consequências práticas

O fã quer saber, e com razão, qual o desdobramento prático para a competição de tudo isso que está acontecendo?

Faz sentido acreditarmos que, se não for na temporada deste ano, ao menos na de 2021 haverá maior nível de competitividade entre as equipes. A Mercedes poderá levar Lewis Hamilton em Baku, em junho, em um carro muito rápido, a ponto de assustar os concorrentes.

Mas estes saberão que em 2021 o máximo que o grupo liderado por Toto Wolff e James Allison, na Mercedes, poderá oferecer a Hamilton é uma variação do W11 deste ano. As chances de a equipe alemã se apresentar com outro modelo muito mais eficiente que o da maioria, como temos assistido nos seis últimos anos na F1 – são hexacampeões -, serão menores.

Esse modelo de competição, em que os carros de 2021 deverão ser semelhantes à versão que irá concluir o campeonato deste ano, tende a reduzir as diferenças de performance entre os competidores.

Bico e aerofólio de um carro de F1 da Mercedes-Benz com a placa de campeão mundial da temporada 2019
Novas diretrizes da F1 podem acabar com a supremacia da Mercedes-Benz, campeã de 2019
Crédito: Divulgação
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Os adversários da Mercedes, caso o modelo W11 se mostre muito superior este ano, conhecerão melhor até onde, mais ou menos, a equipe poderá chegar. Obviamente, o mesmo vale se o RB16-Honda de Max Verstappen ou a Ferrari SF1000 de Charles Leclerc surpreenderem.

Nunca é demais lembrar que, apesar de as três semanas de férias de agosto terem sido transferidas, agora para março e abril – outra deliberação da conferência por telefone entre FOM, FIA e equipes -, todos os times deverão levar para Baku versões avançadas de seus modelos de 2020. Não serão as que estavam prontas em Melbourne, para o início do campeonato.

Esse adiamento - a princípio de três meses  - no começo da temporada pode gerar algumas novidades quando os carros forem para as pistas. A Ferrari, por exemplo, terá um carro profundamente revisto pelo engenheiro Simone Resta, com pouca participação no projeto do SF1000, pois estava até a metade do ano na Alfa Romeo.

O mesmo raciocínio vale para o segundo pelotão da F1, formado por Racing Point, que correrá com o carro de 2019 da Mercedes, McLaren, Renault e Alpha Tauri.

E por que não consideramos a possibilidade de as três escuderias restantes da mesma forma darem importante passo à frente.? É apenas menos provável, mas não impossível. São elas: Alfa Romeo, Haas e Williams.

Prevaleceu o bom senso

Para resumir nossa conversa, a decisão das principais vertentes da F1 obedeceu critério lógico e sensato diante das circunstâncias. Ter de aguardar um ano a mais pela nova e promissora F1 é um custo pequeno diante da gravidade da conjuntura econômica mundial.

Ah, e com o bônus de que, se não for este ano, o mundial de 2021 poderá ser dos mais emocionantes diante de os carros não poderem ser muito distintos dos que terminarão esta temporada.

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