O mercado automotivo brasileiro passa por uma revolução silenciosa, mas perceptível: os SUVs estão dominando as ruas e, no processo, deixando os hatches à beira da extinção. Mas por que isso acontece? Será que é apenas uma tendência ou há razões práticas para essa troca?
Nos anos 2000, a Ford criou um dos modelos mais influentes do mercado brasileiro: o EcoSport. Ele nada mais era do que um Fiesta "aventureiro", mas a ideia de um carro mais alto, robusto e com visual imponente conquistou o consumidor. Com isso, nasceu a primeira dúvida na cabeça do comprador: levar um hatch bem equipado ou um SUV básico?
De lá para cá, os SUVs se diversificaram e ocuparam espaços antes dominados pelos hatches médios, pelos sedãs médios e agora até mesmo pelos compactos. Os números de vendas comprovam: os consumidores preferem um SUV de entrada a um hatch topo de linha. Mas por quê?
A mudança de preferência tem razões práticas e emocionais. Os SUVs transmitem uma maior sensação de segurança por conta da altura e do porte mais robusto. Além disso, costumam oferecer melhor aproveitamento de espaço interno e mais conforto na suspensão.
Mas há também o fator status. A posição de dirigir elevada e o visual mais imponente são elementos que influenciam a decisão do consumidor.
Uma das maiores justificativas para a ascensão dos SUVs está na equivalência de preços. Em muitos casos, um hatch topo de linha custa o mesmo (ou até mais) do que um SUV de entrada. Confira alguns exemplos:
Ou seja, um consumidor que tem cerca de R$ 130 mil pode escolher entre um hatch completamente equipado ou um SUV básico. E a escolha tem sido cada vez mais pelo SUV.
Se olharmos apenas o varejo, o domínio dos SUVs é ainda maior. Em 2024, o carro mais vendido no varejo foi... isso mesmo, um SUV, o Hyundai Creta.
Nas vendas gerais (vendas diretas e varejo juntas), o Volkswagen Polo foi o líder de vendas entre, com 140.177 unidades, mas 68,31% (95.763) foram de vendas diretas, segmento focado na comercialização para frotistas e locadoras.
E ele não é o único. O mesmo aconteceu com o Fiat Argo, por exemplo. Do total de 91.139 unidades comercializadas, 68,95% (62.843) foram de vendas diretas.
O Hyundai HB20 também segue o mesmo perfil. No último ano, o veículo registrou um total de 97.079 unidades. No entanto, 55,6% (54.034) foram no segmento de vendas diretas.
De forma mais recente, nos primeiros dias de março, o hatch da Hyundai vendeu 1.705 unidades, passando o líder Polo. No entanto, fontes ligadas à marca afirmam que, desse total, 76,36% foram de vendas diretas. Além disso, 1.241 unidades foram da versão Comfort 1.0, a mais acessível e mais buscada por frotistas.
Nos SUVs, o cenário é oposto. O Hyundai Creta vendeu 69.116 unidades no total, mas apenas 13.035 foram vendas diretas – ou seja, ele é um carro de consumidor final. O Volkswagen T-Cross seguiu a mesma tendência, com mais vendas no varejo (39.767) do que para frotistas (44.223).
Isso mostra que, sem as vendas diretas, os hatches compactos estariam ainda mais pressionados.
No passado, quando a diferença de preço dos SUVs era ainda maior em relação aos demais segmentos, os integrantes da categoria eliminaram os hatches médios, como Golf, Focus e Bravo. Agora, com essa margem de preço sendo reduzida, estão engolindo os compactos.
Quer outro exemplo? Como mencionado pelo WM1, o Polo GTS está com os dias contados. O hatch com pegada esportiva dará lugar ao Nivus GTS, SUV que chega em breve ao mercado brasileiro.
E não para por aí: os sedãs médios também estão sumindo. Tanto que, em 2024, dos 20 automóveis mais vendidos do Brasil, apenas três eram sedãs, sendo que a maioria estava nas posições mais baixas do ranking. No top 10, somente um integrante: o Chevrolet Onix Plus, com 59.960 emplacamentos, sendo que 57% foram de vendas diretas.
Por fim, imagine ter um carro vendido no mercado brasileiro desde a década de 90 e a variante recente do veículo, lançada em 2021, vender mais que o modelo original. É o que acontece atualmente com a linha Corolla. O sedã vendeu, em 2024, 37.668 unidades, enquanto o Corolla Cross vendeu 47.796 exemplares no mesmo período.
O futuro é claro: se nada mudar, o mercado será cada vez mais dominado pelos utilitários esportivos. Afinal, o consumidor já decidiu: ele prefere um SUV.