Demorou, mas finalmente foi publicado no penúltimo dia de 2023 o esperado programa de incentivos que substituiu o Rota 2030, encerrado também no final do ano passado. O Mover – sigla para Mobilidade Verde e Inovação – ficou dentro do esperado. O mais importante é a previsibilidade que dá suporte essencial aos investimentos que a indústria automobilística precisa fazer. Algo essencial para sobreviver em um cenário de grandes mudanças, que vão das novas tecnologias de propulsão às emissões de baixo carbono obtidas por biocombustíveis como o etanol.
De imediato surgiram críticas de alguns economistas sobre o custo de R$ 19 bilhões para os contribuintes e a falta de “clareza e justificativa”. São sempre os mesmos, e desconhecem (ou fingem desconhecer) que, ao longo de quase 70 anos, a taxação sobre a venda de veículos leves no Brasil está em primeiro lugar no mundo e muito distante da que é praticada em quase todos os outros países. Quem compra carro já ajuda a encher os cofres governamentais há sete décadas - a se completarem em 2026.
Somando-se os impostos federais e estaduais, a parte dos governos atinge 27,3% dos preços ao consumidor, contra médias de 17% na Europa, de 9% no Japão e de 7% nos EUA. Deve-se acrescentar mais 4%, em média, do anual IPVA. Em um cálculo mais apurado, basta dividir o preço com imposto pelo preço sem imposto: a carga fiscal é de 45%, contra 7,5% nos EUA, 9,9% no Japão e 20,5% na Europa.
Programas como o Mover também foram lançados por outros países. O mais recente, nos EUA, tem montante de US$ 50 bilhões (R$ 250 bilhões). Aqui, parte dos tais R$ 19 bilhões será recuperada pelo imposto de importação (I.I.) sobre elétricos e híbridos (haverá uma cota pequena de I.I. isento para todas as marcas). Isso se dará gradualmente até 2026. A tributação de 35% tornará viável a fabricação de elétricos no Brasil. Sem a volta deste ônus, como era até 2023, não passavam de bazófia os anúncios de produção local.
Alguns importadores, como Kia e Volvo, não repassarão o I.I. integral para sua lista de preços nos primeiros meses de 2024. Um dos pontos de maior destaque do Mover é a introdução do cálculo de emissões de CO² do poço (ou do campo) à roda, e não apenas do motor à roda. Um conceito de abrangência maior e justo. Em uma segunda etapa, o cálculo será feito do berço ao túmulo - ou seja, de impacto ainda mais significativo por avaliar aquele gás de efeito estufa nas operações de fabricação à reciclagem.
Outra referência positiva está no índice de nacionalização dos veículos, que volta a ser considerado nesse programa, inclusive ao autorizar importação de linhas de montagem usadas.
De fato, não está muito fácil prever este ano quanto à recuperação das vendas. No entanto, a discrepância dos números não costuma ser tão clara entre as duas entidades com uma diferença de seis pontos percentuais ou, nominalmente, o dobro. A associação das concessionárias (Fenabrave) está mais otimista, pois estima um total de 2,59 milhões de unidades entre veículos leves e pesados a serem comercializadas este ano, ou 12% a mais sobre 2023. A Fenabrave, em janeiro do ano passado, tinha sido mais contida ao prever crescimento zero ao final dos 12 meses. Porém, o programa de bônus oferecido pelo Governo Federal, em junho e julho, ajudou a melhorar o resultado do ano, o que obviamente não estava nas previsões.
O crescimento de 9,7% em 2023 (2,309 milhões de unidades) foi ajudado por compras das locadoras e uma pequena melhora na oferta de crédito, segundo José Andreta Jr., presidente da Fenabrave. Em 2024, ele espera 2,585 milhões de unidades. Por seu lado, a Anfavea prevê que o mercado interno cresça, este ano, 6,1% - para 2,450 milhões de unidades. As exportações continuarão estagnadas pelo avanço simbólico de 0,7% para 407 mil veículos. A produção deverá aumentar 6,2% e chegar a 2,470 milhões de unidades. Em dezembro último, os estoques nos pátios das fábricas e concessionárias representavam 25 dias de vendas, bem abaixo de até 40 dias considerados normais. As vendas, em 2023, somaram 2,180 milhões de unidades, uma alta de 11,2% sobre 2022.
Marcio Leite, presidente da Anfavea, afirmou que torce para a confirmação das previsões da Fenabrave: "As concessionárias estão mais perto dos compradores e, assim, podem sentir melhor a pulsação do mercado”, afirmou. A entidade considera que os maiores benefícios do programa Mover serão para a sociedade, a atividade econômica e o meio ambiente.
Depois do progresso notável dos SUVs no mercado brasileiro, as picapes não ficaram para trás. Em um mercado historicamente dominado por hatches compactos, as picapes compactas, médias e grandes subiram de 16,5% de participação nas vendas de todos os segmentos em 2022 para 18,5% em 2023. E a Strada voltou a ser, em 2023, pelo terceiro ano consecutivo, o modelo mais vendido entre todos os segmentos de veículos leves.
Se existe uma diferença marcante em relação às outras versões é justamente o motor tricilíndrico turbo de 1.0 litro, 125 cv (G)/130 cv (E) e 20,4 kgf.m. A agilidade que faltava agora se tornou um destaque com a ajuda de um câmbio automático CVT de sete marchas. Para uma massa de 1.253 quilos e capacidade de carga de 650 quilos, mostra desenvoltura e boas respostas ao acelerador. E com as pequenas alavancas para trocas de marchas atrás dos dois raios do volante (ou pela alavanca seletora, a escolher), há facilidade para reduções nas descidas de serras. A aceleração de zero a 100 km/h é convincente: 9,5 s.
Não se pode esperar acabamento e riqueza de materiais na cabine para esse tipo de veículo. Porém, deveria ser melhor diante do preço de R$ 135.990. Faz falta a regulagem de distância do volante, e o quadro de instrumentos tem dimensões acanhadas. O espaço para pernas, ombros e cabeças no banco traseiro é adequado apenas para dois adultos com até 1,75 m de altura. Mesmo o ocupante do banco dianteiro do carona ficará com os joelhos muito próximos ao porta-luvas. Os ângulos de abertura das portas traseiras facilitam a entrada dos ocupantes.
A distância entre-eixos de 2.737 mm (a mesma de um Chevrolet Omega, um sedã grande dos anos 1990) e o vão livre do solo de 18,5 cm são adequados à proposta do produto. As molas monocorpo parabólicas com eixo rígido na traseira formam um conjunto eficaz, mas os freios a tambor atrás podem parecer algo rudimentar, embora dêem conta do serviço. Fato comprovado pelas vendas e pelo quase total domínio do segmento, à frente de VW Saveiro, Chevrolet Montana e Renault Oroch.