A partir de agosto, o nível de etanol anidro misturado à gasolina comum vendida nos postos brasileiros vai subir de 27% para 30%. Você viu isso ontem aqui no WM1.
Esse aumento foi aprovado pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e, embora pareça técnico à primeira vista, levantou dúvidas: essa nova proporção exige algum tipo de adaptação nos motores? Lembre-se que o Instituto Mauá de Tecnologia (IMT) fez diversos testes e afirmou que "não houve mudanças relevantes nos parâmetros avaliados". Mas e o comportamento do veículo, muda?

A resposta curta é: não. Já a resposta longa - e mais interessante - envolve entender por que o Brasil pode dar esse passo sem qualquer tipo de susto. Para isso, consultamos especialistas - alguns direto das fabricantes, que preferiram não se identificar.
Também entramos em contato com a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e com a Sociedade de Engenheiros Automotivos (SAE), organização global de engenheiros e especialistas técnicos focada em mobilidade.
Antes de entrar no mérito sobre as respostas do veículo, seja ele um carro ou uma moto, temos que destacar que o etanol anidro, usado na mistura da gasolina, é diferente do etanol hidratado, que é vendido como combustível nos postos.
Segundo o engenheiro Erwin Franieck, Membro do Conselho Superior da SAE BRASIL e do Conselho de Inovação da SAE4MOBILITY, "o etanol anidro não é nocivo".
"O grande problema é a água do etanol combustível. O grande desafio desses motores é suportarem até 7% de água. Como o anidro tem menos de 1% de água, sua atuação na gasolina funciona quase como a de um aditivo de alta octanagem — melhorando a queima, sem comprometer o sistema", diz o especialista.
Dois engenheiros que conversaram com a reportagem do WM1 - um de marca generalista e outro de fabricante premium - concordam com o argumento de Franieck. "O grande problema para nossos produtos, alguns flex, mas quase todos movidos só a gasolina, é justamente a quantidade de água no etanol", explica o da empresa de luxo.
Na prática, a diferença entre a gasolina E27 e a E30 é mínima. O Instituto Mauá de Tecnologia testou carros e motos com a mistura e disse que não há prejuízos de desempenho, consumo ou emissões.
Mas, leia de novo: "não houve prejuízos". Portanto, pode haver leves diferenças em números práticos.
Exemplo: um carro que fazia 10 km/l pode passar a fazer 9,8 km/l - efeito considerado irrelevante, mas que de certo modo existe, ainda mais se estimado em larga escala. Em contrapartida, em motores flex essa gasolina E30 pode melhorar o rendimento, ainda mais nos que têm taxa de compressão elevada.
"A gasolina E30 é uma vantagem para carros flex, que têm taxa de compressão mais tardia. Isso vai retardar a centelha, que pode causar sutil queda no consumo, mas faz o rendimento melhorar, já que o mapa de avanço também cresce”, explica Franieck.
Portanto, motores com taxa de compressão a partir de 11:1 tendem a se beneficiar mais. Já em motores que operam abaixo disso não se espera ganho relevante.
Além disso, o preço da gasolina E30 deverá ser menor que o da atual. "O Ministério de Minas e Energia tem comentado de que haverá redução de R$ 0,11 a R$ 0,13 no litro", explica Gilberto Martins, Diretor de Assuntos Regulatórios da Anfavea.
Os testes mostraram que esses tipos de veículos também rodam normalmente com E30. Mas vale uma ressalva técnica importante: quanto mais antigos os sistemas de injeção ou carburadores, maior a chance de desgaste ou corrosão em componentes como bombas e bicos.
Nada alarmante, mas é recomendável fazer revisões preventivas em veículos fora do escopo flex ou que não tenham sido "tropicalizados" para uso com alto teor de etanol.
"Avançamos para a gasolina E30, mas o limite estimado seria uma E40. Ela não traria problemas para o motor, mas exigiria adaptações em carros só a gasolina ou mais velhos", completa Erwin Franieck.
Em resumo, a gasolina E30 é uma evolução técnica silenciosa, embalada por uma matriz energética mais limpa e pela capacidade do parque automotivo nacional de operar com uma gama ampla de combustíveis.
Isso porque a gasolina E30 é mais amigável ao meio ambiente devido à redução de emissões de gases de efeito estufa e pela maior utilização de uma fonte de energia renovável, como a cana-de-açúcar.
Ou seja, a regra muda, mas, para o motorista comum, tudo continua igual - ou até um pouco melhor.